Nenhum Olhar - José Luís Peixoto


Realismo versus surrealismo

“E a venda do judas, que seria fresca se aquela fosse uma manhã normal, que seria fresca como a sombra, era o calor da rua e o sol e a luz e os homens a olharem-me e o demónio a sorrir e um copo de vinho tinto à minha frente e o balcão a arder de calor e o suor a ferver-me na pele e o demónio diante de mim a sorrir e o seu olhar a puxar o meu olhar e os homens a olharem-me e a luz e o sol e as minhas pernas sem força e os meus braços murchos na carne e os meus braços atrofiados no seu peso morto e o meu rosto diante do meu rosto e o meu rosto como num espelho e o meu rosto vencido e gasto e velho diante da morte e o tentador diante de mim a dizer a tua mulher e a sorrir e a dizer o José e a sorrir e a dizer os dois e a sorrir e a dizer como bichos e a sorrir e a dizer ele em cima dela e a sorrir e a dizer como bichos e a sorrir e o copo de vinho a aquecer-me mais e a luz e o sol e a morte e a morte e a morte e o demónio a sorrir e a dizer o José e a sorrir muitas vezes muitas vezes muitas vezes. A venda do judas seria fresca se aquela fosse uma manhã normal. A venda do judas era o calor da rua. Era o sol. Era a luz. Os homens olhavam-me. Bebi um copo de tinto. O demónio sorria. O demónio sorria e dizia a tua mulher está com o José, estão os dois juntos, como bichos, ele em cima dela, a foder.”

Um livro pouco fácil mas envolvente.

Festival Andanças

Melhor que as palavras, aqui ficam as imagens...

E foi vivido com tanta intensidade...